"Presidente" pode, sim, assumir no feminino a forma "presidenta", já existente na língua
Pela primeira vez no Brasil uma mulher é eleita para o cargo de presidente da República. Será ela "a presidente" ou "a presidenta" do país?
A forma "presidente", herdeira de um tempo verbal latino chamado particípio presente, pode servir, atualmente, a ambos os gêneros, bastando para tanto que se faça anteceder do artigo desejado: o presidente (masculino) ou a presidente (feminino).
No latim, havia particípio passado, presente e futuro.
No português, permaneceu apenas o primeiro, embora os outros dois ainda possam ser reconhecíveis em algumas palavras, que, entretanto, perderam a força característica dos verbos. Resquícios do particípio futuro aparecem em certas palavras terminadas em -ouro ("duradouro", "vindouro" etc). Do particípio presente, herdamos grande número de palavras, tanto substantivos como adjetivos ou mesmo conectivos. Sua característica formal é a terminação "-nte", que indica agente de uma ação: estudante (o que estuda), fumante (o que fuma), presidente (o que preside) etc. Adjetivos são provavelmente a maior parte dos termos derivados do particípio presente latino (estimulante, independente, ardente, quente, carente, decente, atraente, elegante, competente, valente etc.)
No português, o gerúndio assumiu o lugar do particípio presente na expressão de ação em curso.
Daí a terminação "-nte" estar associada a nomes, não a verbos, mas, numa construção como "temente a Deus", por exemplo, pode-se dizer que há um vestígio do particípio presente.
Note-se, porém, que essa terminação continua fértil na língua. Além de termos derivados de verbos ("palestrante", "contribuinte"), há os formados por analogia, caso de "cadeirante", palavra de entrada recente na língua, calcada em "ambulante".
Entre os adjetivos, não há hesitação quanto a gênero -são uniformes, sem flexão.
Os substantivos oscilam, ora assumindo a desinência "-a'" de feminino, ora mantendo-se invariáveis. "Infante", por exemplo, tem feminino ("infanta"). É bastante conhecida a peça musical de Ravel cujo título é traduzido para o português como "Pavana para uma Infanta Defunta".
"Parente" também admite o feminino ("parenta").
É esse o caso ainda de "presidente", que pode, sim, assumir no feminino a forma "presidenta", existente na língua há muito tempo, embora de uso pouco comum.
Os que defendem o reforço da inclusão de gênero advogam ser a forma marcada a mais adequada neste momento.
THAÍS NICOLETI DE CAMARGO é consultora de língua portuguesa do Grupo Folha-UOL.
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