Um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV) Direito Rio e da
Universidade Federal Fluminense (UFF) apontam problemas nos concursos
públicos federais. Entre eles, provas que não avaliam as experiências e o
conhecimento do candidato e má gestão. As duas instituições propõem
mudanças no processo de recrutamento para o serviço público.
O estudo mostra que o concurso tem perdido a principal finalidade
para o qual foi criado, que é selecionar um profissional adequado para
cargo na administração pública. “O concurso no Brasil tem cada vez mais
se tornado um fim em si mesmo. Seleciona as pessoas que têm mais
aptidão para fazer prova de concurso. Temos uma ineficiência de
fiscalização de competências reais. E além disso, apesar de existirem
mecanismos que possibilitam a demissão, como o estágio probatório, eles
quase não são utilizados. Os concursos hoje alimentam um mercado
milionário”, avalia o coordenador da pesquisa e professor da FGV
Direito Rio, Fernando Fontainha, que divulgou no dia 22 o
levantamento.
Os dados vão além e apontam que os
salários ofertados são estipulados conforme a complexidade do certame, e
não com base no nível acadêmico ou na competência do candidato. Quanto
mais difícil e maior o número de provas, maiores as remunerações.
Para reverter esse cenário, o estudo propõe medidas, como o fim das
provas objetivas (múltipla escolha). De acordo com o levantamento, cerca
de 97% das provas aplicadas em 698 seleções, entre 2001 e 2010,
seguiam o modelo. A proposta é o uso de questões escritas discursivas
que abordem situações reais a serem vivenciadas pelos futuros
contratados. Além disso, defende a aplicação de prova prática nos casos
em que a discursiva for insuficiente para avaliar a qualificação do
candidato.
Outra proposta é impedir o candidato de se inscrever para o mesmo
concurso mais de três vezes. O estudo constatou que acima de um terço
dos inscritos não comparece ao certame. “A realização das provas é algo
caro. A intenção é que o candidato se inscreva quando tiver condições
de passar [aprovado]“, explica Fontainha.
Os pesquisadores defendem três processos distintos de seleção dos
servidores públicos. O primeiro, chamado recrutamento acadêmico, propõe a
busca por jovens recém-formados, com o objetivo de que sejam
capacitados para o exercício da futura função. As provas aplicadas a
esses candidatos devem abordar os conhecimentos universitários e
escolares, e a formação inicial será obrigatória.
O segundo, o recrutamento burocrático, visa à admissão de
profissionais já inseridos na administração pública. Para participar, o
candidato deve ter ao menos cinco anos de experiência. As provas serão
sobre o ambiente do serviço público. Já o terceiro, o profissional, irá
avaliar quem atua no mercado e tenha experiência mínima de dez anos.
Nesse caso, o candidato é avaliado sobre conhecimentos de mercado e da
administração pública.
Em relação às provas, a sugestão é criar uma empresa pública para
gerir os concursos e elaborar os exames. O levantamento detectou a
presença majoritária de sete institutos e centros responsáveis pela
elaboração das provas, entre eles o Centro de Seleção e de Promoção de
Eventos Universidade de Brasília (UnB), que detém a maior fatia do
mercado.
A Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac)
estima movimento de mais de R$ 30 bilhões no setor. “É uma questão que
tem que ser debatida. Devemos analisar se é mesmo necessária a criação
de uma empresa pública ou se é necessário apenas regular o mercado de
uma forma diferente”, disse o coordenador de Negócios do Instituto de
Desenvolvimento Educacional, Cultural e Assistencial Nacional (Idecan),
Bruno Campos. O instituto também organiza seleções.
Para os pesquisadores, os três anos estabelecidos pela lei para o
estágio probatório devem ser destinados rigorosamente para capacitação,
sendo, no primeiro ano, com aulas presenciais, e nos demais, início do
exercício do cargo com acompanhamento de um servidor experiente.
De acordo com a Nayara Teixeira Magalhães, consultora acadêmica do
projeto Pensando o Direito – parceria entre o Ministério da Justiça e o
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o ministério e
os demais 20 parceiros da pesquisa irão analisar as propostas. Uma
versão final do relatório deve sair até o dia 15 de abril.
Da Agência Brasil
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