A
partir desta semana, hospitais e maternidades das redes pública e
particular passam a ser obrigados a fazer o chamado teste da linguinha
em recém-nascidos. A determinação foi criada pela Lei 13.002/2014. O
objetivo do exame é detectar se existe alguma alteração no chamado
frênulo, membrana que liga a língua à parte inferior da boca – também
conhecido como freio. A alteração pode gerar a popular língua presa.
A comerciante Eliane Tobar descobriu que o filho mais novo, hoje com 1
ano, tinha o problema quando encontrou dificuldade para amamentar. O
diagnóstico foi feito um mês depois do nascimento do bebê. “Eu reclamei
para a doutora que na hora em que ele ia mamar, doía muito. A dor era
insuportável no braço. Ele mamava a cada 20 minutos, meia hora”.
A fonoaudióloga e integrante da Sociedade Brasileira de
Fonoaudiologia Roberta Martinelli criou a metodologia para fazer a
avaliação de bebês e diagnosticar o problema. “No primeiro momento, o
teste veio para detectar a língua presa, que é quando esse fio está
fixado mais para a ponta da língua. Só se considera língua presa quando
limita o movimento”. Os problemas vão além da dificuldade na fala. No
caso dos recém-nascidos a alimentação pode ser prejudicada, já que afeta
a sucção. “Tem sido uma das maiores causas de desmame precoce. Ele [o
bebê] pode ter dificuldade de passar para a papinha porque tem
dificuldade de deglutição. Por volta de um ano e meio, pode ter
problemas no processo mastigatório também”.
A fonoaudióloga lembra que o exame observa os aspectos físicos da
língua, mas que outras características também precisam ser avaliadas
como, por exemplo, a maneira como a criança mama e até mesmo o choro.
“A gente observa características do choro porque o bebê que tem essa
língua presa sobe mais as laterais do que a ponta da língua. Ela [a
ponta] fica mais baixa que as laterais”. No caso do filho de Eliane, a
solução foi um procedimento cirúrgico conhecido como pique. Um corte foi
feito no freio para que a língua pudesse ter mais movimento. Com
anestesia local, a cirurgia dura poucos minutos e logo em seguida a
criança já pode ser amamentada.
O filho mais velho de Eliane também foi diagnosticado com a língua
presa mas, diferentemente do caçula, já estava maior. A mãe comenta a
dificuldade que teve de alimentar o primeiro filho. “Foi uma pena mesmo
que eu não consegui amamentar, porque tinha leite mas não conseguia. Ele
não dava conta de engolir”. A cirurgia, nesse caso, também foi
recomendada.
Apesar de a lei ser considerada um avanço em alguns aspectos, a
pediatra Patrícia Salmona, que integra o Departamento de Genética
Clínica da Sociedade Brasileira de Pediatria, acredita que é preciso
considerar alguns pontos com relação ao tratamento. Ela conta que
existem graus diferentes de língua presa e, por isso, o tratamento
varia. “Nem todas têm a indicação do tratamento do pique na língua. As
que não têm indicação cirúrgica poderiam ser mandadas sem necessidade
[para cirurgia]”.
Patrícia lembra que, muitas vezes, não há consenso entre os
profissionais que fazem o teste com relação ao procedimento cirúrgico.
“A prevalência da língua presa gira em tono dos 15% mas, desses, nem 10%
têm indicação de fazer o procedimento. Metade seria necessária e na
outra metade fica a dúvida”. Ela explica que, muitas vezes, a criança
precisa ser reavaliada e defende que o diagnóstico seja feito por
profissionais habilitados.
Para a fonoaudióloga Roberta Martinelli, os profissionais precisam
ser treinados e é necessário adotar um protocolo para ajudar na
padronização do teste. “Enquanto não se tiver uma padronização, vão
fazer no ‘achômetro’ e isso não pode. Estamos lidando com bebês. O
protocolo só indica para a cirurgia quando o caso é extremamente nítido.
E esses casos não podem sair da maternidade sem diagnóstico”.
Segundo a assessoria do Ministério da Saúde, as diretrizes que trarão
o detalhamento para o diagnóstico estão sendo elaboradas pela Comissão
Nacional de Incorporação de Tecnologias e um grupo de trabalho formado
pela Coordenação-Geral de Saúde da Criança, diz a nota. Ainda conforme o
texto, a diretriz nacional trará recomendações sobre como fazer o
teste, e o ministério tem orientado os profissionais sobre a importância
da avaliação.
De acordo com a assessoria do ministério, mesmo sem a
regulamentação, a aplicação da lei está valendo e a norma vai reforçar o
que já é feito hoje. A avaliação e a cirurgia são oferecidas
gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), assim como outros
testes importantes como o do pezinho, da orelhinha e do olhinho.
O deputado federal autor da lei, Onofre Augostini (PSD-SC), informa
que o Ministério da Saúde será o responsável pela fiscalização e
acredita que com a obrigatoriedade, muitos problemas serão evitados.
“Vai evitar que quando a criança fique adulta, se ela apresentar a
deficiência chamada linguinha presa, tenha dificuldade para falar, para
amamentar”.
Martinelli diz que agora a expectativa é de que as diretrizes do
ministério sejam logo elaboradas. “O que queremos é que não demore
muito. Quanto mais demora, mais as maternidades vão demorar a se
adequar”.
Para Patrícia Salmona, a grande vantagem da lei é que a partir de
agora mais crianças poderão ser diagnosticadas. “Não é uma frequência
tão baixa. Então, fazer uma triagem é interessante. Seremos o primeiro
país a fazer essa triagem”. E completa: “Vem para somar, como uma
ferramenta a mais para o médico”. Ela observa que caso a cirurgia seja
necessária, quanto menor a criança, mais rápida é a recuperação. “A
cirurgia seria praticamente indolor. Não é uma cirurgia grande, mas logo
que nasce é uma coisa ínfima”.
Agencia Brasil
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