O escândalo de corrupção que abala as estruturas da Fédération
Internationale de Football Association (Fifa) já começa a afetar os
negócios das Organizações Globo, em um dos seus setores ainda lucrativos. Segundo a revista semanal Carta Capital,
na atual edição, “o dinheiro para pagamento de propinas vinha dos
direitos de transmissão das partidas”. Por isso, “não será surpresa se o
FBI bater na porta da família Marinho, dona da Globo“.
O escândalo atinge não apenas empresas de porte internacional, como a TV Globo,
no Brasil, e a Nike, nos EUA, mas países como a Alemanha, a França e a
Irlanda, onde já se insinua ter recebido bolada da Fifa para ficar
calada sobre situações irregulares na instituição. Não obstante o volume
de provas sobre os crimes praticados contra a economia popular e os
pagamentos de propinas, a Fifa tem recebido, nos últimos 16 anos,
certificados quanto à lisura de sua administração. O ‘nada consta’ tem
sido assinado, ao logo deste período, pela empresa de auditores KPMG,
uma das maiores do mundo. A KPMG também será investigada, segundo o
processo.
Sócio perigoso
O empresário J. Hawilla, um dos maiores parceiros da Rede Globo
nas negociações referentes aos torneios de futebol, já confessou a sua
culpa no caso e, além do pagamento de uma multa milionária, está
colaborando com as investigações em um acordo por uma condenação menor.
A capa da Carta Capital desta semana traz um álbum de figurinhas estilizado com Ricardo Teixeira (indiciado pela Polícia Federal),
Joseph Blatter (presidente renunciado da Fifa), Jérôme Valcke
(investigado pela Justiça dos Estados Unidos), José Hawilla (réu
confesso) e José Maria Marin (preso na Suíça). A sexta imagem é o
símbolo da Rede Globo e um ponto de interrogação.
Jogo pesado
Além das Organizações Globo, a Nike e outras grandes companhias
internacionais também entraram na mira de uma investigação sobre o papel
influente que exercem no futebol brasileiro, como parte dos esforços do
ex-jogador e atual senador Romário (PSB-RJ) de expor o que descreve
como contratos de marketing suspeitos e ligações a pagamentos corruptos.
Romário, que comandou o Brasil na conquista da Copa do Mundo de 1994
usando chuteiras da gigante norte-americana de material esportivo, está à
frente de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre acordos de
patrocínio no futebol, após as acusações do Departamento de Justiça dos
Estados Unidos que abalaram o mundo do futebol.
Três brasileiros estão entre os acusados no indiciamento
norte-americano, incluindo o ex-presidente da Confederação Brasileira de
Futebol (CBF) José Maria Marín.
Romário e procuradores brasileiros ainda não acusaram a Nike de ter
feito qualquer coisa ilegal, apesar de o acordo de US$ 160 milhões da
companhia firmado em 1996 para patrocinar a seleção brasileira estar
ligado a supostas propinas, de acordo com a acusação dos Estados Unidos
divulgada na semana passada.
A Nike ainda não está entre os acusados, mas só há uma companhia que
se encaixa com a descrição dos procuradores norte-americanos. Em nota na
última semana, a Nike informou que as acusações não alegam que a
empresa participou de condutas criminais ou que seus empregados estavam
envolvidos ou conscientes de subornos.
Romário, principal voz no país em defesa de reformas no futebol, cuja
fama em campo impulsiona sua influência, diz que deseja investigar tal
acordo de patrocínio para averiguar se o contrato foi usado para desviar
dinheiro para dirigentes e exercer influências indevidas no esporte.
A CPI, que deverá ser instalada na próxima semana, terá o poder de
intimar testemunhas e obter registros bancários e contratos privados,
mas não poderá emitir mandados de busca ou apreensão.
Entre as companhias cujos acordos de patrocínio com a seleção
brasileira nos últimos anos devem ser analisados estão a TAM, parte da
Latam Airlines, e a Ambev, atualmente subsidiária da Anheuser-Busch
InBev.
– Estas empresas serão a frente e o centro na investigação… Elas não
conseguirão ficar em silêncio. As pessoas estão de saco cheio e querem
saber o que os patrocinadores estão fazendo com o poder de seus talões
de cheques para exigir mudanças no esporte – disse Fernando Ferreira,
presidente da empresa de marketing esportivo Pluri.
Marketing milionário
O inquérito norte-americano informou que o acordo de 1996 da
“Companhia Esportiva A” – aparentemente a Nike – aceitou pagar US$ 40
milhões em “honorários de marketing” que não estavam em seu contrato
inicial com a CBF para a conta de uma afiliada da empresa brasileira de
marketing esportivo Traffic em uma conta bancária na Suíça.
José Hawilla, o fundador da Traffic que foi nomeado no inquérito como
condenado por suborno, aceitou dividir metade de tudo que recebeu pelo
acordo com um membro sênior não identificado da CBF, de acordo com o
Departamento de Justiça norte-americano. Isto equivalia a “milhões de
dólares, como suborno e propina”, de acordo com a acusação.
A nova CPI do Senado repete um inquérito do Congresso de 15 anos
atrás. Aquela investigação foi consumida por lutas políticas internas e
não resultou em acusações formais, mas trouxe à luz aspectos secretos do
acordo da Nike, como o direito de organizar cinco partidas amistosos
para a seleção por ano, escolhendo oponentes e jogadores incluídos nos
chamados “jogos da Nike”.
A nova investigação liderada por Romário rapidamente ganhou o apoio
de colegas senadores e do governo da presidente Dilma Rousseff. Ele diz
que os brasileiros não irão tolerar a mesma impunidade que ocorreu
depois da última investigação.
“Considero o momento bem diferente, os cartolas estão enfraquecidos. O
mundo inteiro está de olho nisso, não é só uma questão de futebol do
Brasil”, disse Romário à agência inglesa de notícias Reuters, por e-mail.
“Não podemos permitir que o futebol continue sendo uma camuflagem
para tantos crimes. Mas o que posso te afirmar, com certeza, é que eu
farei o possível para levar bandidos para a cadeia”, acrescentou.
Os investigadores dos acordos dos anos 1990 disseram que as práticas empresariais sobre o esporte mudaram pouco desde então.
O atual presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, diz que não sabia de
nada sobre o suposto esquema de propinas envolvendo a entidade e está
cooperando com investigações das autoridades.
Sob o atual patrocínio da Nike com a seleção brasileira, que vai até
2026 e sem detalhes públicos, a empresa paga à CBF US$ 40 milhões por
ano, de acordo com uma fonte familiarizada com o contrato.