O Reino Unido decidiu em
referendo, por mais de 1,2 milhão de votos de diferença, deixar a União
Europeia (UE). O resultado da consulta foi divulgado na madrugada desta
sexta-feira (24). O primeiro-ministro britânico, David Cameron, que
defendia a permanência no bloco, anunciou que deixará o cargo em
outubro. Mas o que muda a partir de agora? Para entender o novo cenário e
os reflexos da decisão no bloco e no resto do mundo, o Portal EBC conversou com o professor Creomar Souza Lima, assessor de Relações Internacionais e professor da Universidade Católica de Brasília (UCB). Confira:
O que é Brexit?
Quem perde: Reino Unido ou União Europeia?
“Perdem todos. Simbolicamente, a saída do Reino Unido alimenta uma
série de forças anti-integração em todo o continente. Perde o Reino
Unido em âmbito concreto - ao suprimir a possibilidade de mais laços
econômicos e de integração -; e do ponto de vista simbólico perdem todos
porque é afastado o diálogo de que “todos são europeus”.
Quais são os próximos passos?
A saída de um país de um bloco econômico não é uma questão simples e
pode demorar anos para se concretizar. O que se deve observar em um
futuro próximo é a chegada de um novo governo que deve estruturar esse
processo. “Há análises que dizem que esse processo pode durar de seis
meses a um ano. Outras falam em até dois anos. O que sabemos
efetivamente é que se tornou uma decisão e ela terá de ser cumprida. A
saida será encaminhada. A questão é como isso será feito”, aponta.
A coesão do Reino Unido está ameaçada?
A Escócia, há dois anos, decidiu em um referendo por não se tornar
independente do Reino Unido. Com o resultado atual, já avalia a
possibilidade de fazer uma nova consulta para poder se reintegrar à
União Europeia. “A Europa não conseguiu de maneira profunda entrar nos
corações e mentes dos cidadãos do Reino Unido", afirma. O referendo, na
opinião do professor, também representa uma “irresponsabilidade
eleitoral”, já que foi promessa de campanha do primeiro-ministro David
Cameron realizar um referendo para dar aos britânicos o direito de
dedicidirem se queriam ou não sair do bloco.
“O desafio do próximo primeiro-ministro é salvar o Reino Unido e
convencer a população desses países participantes de que vale apostar no
Reino Unido e não na União Europeia”. O professor destaca ainda que o
movimento nacionalista e separatista presente em diversos países do
Reino Unido pode ganhar força com a decisão, lembrando que a Escócia e a
Irlanda votaram pela permanência no bloco. O Brexit deu “nova vida ao
discurso dos grupos nacionalistas dentro do Reino Unido”, diz.
Impactos econômicos
De acordo com o professor, a saída do bloco afeta de forma
fundamental e economia do Reino Unido porque uma série de benefícios
comerciais do bloco serão revistos. Mas ainda é cedo para traçar uma
previsão. “Resta saber se a União Europeia vai querer negociar essas
questões em separado e, ainda, como as autoridade do Reino Unido vão
organizar uma ofensiva comercial para conquistar novos mercados”,
ressalta.
A libra esterlina, moeda do Reino Unido, despencou e atingiu o menor
valor frente ao dólar em 31 anos logo após a divulgação do resultado do
referendo. Para o professor, a possibilidade de revalorização da moeda
está diretamente vinculada à capacidade do novo governo em dizer e
construir ações políticas que demosntrem que a situação vai melhorar.
Como a decisão afeta a relação com o Brasil
Segundo o professor, ainda é cedo para estabelecer um prospecto. “Em
alguns sentidos, toda a classe política europeia está em choque; e do
lado de cá há uma necessidade de compreender o que essa votação
representa para a própria ideia de blocos regionais”, afirma. Ele lembra
que o Mercosul já é alvo de críticas duras de vários setores da
sociedade brasileira e, “em âmbito imagético”, se espelhava na ideia de
comunidade que foi construída na Europa, agora colocada em xeque.
“A política externa brasileira vai ter que lidar com dois elementos:
uma política que seja direcionada para a comuidade europeia e, por outro
lado, entender esse novo posicionamento do Reino Unido nas relações
internacionais”, explica.
A decisão representa uma vitória do conservadorismo?
“Mais do que conservadorismo, uma vez que em algum sentido David
Cameron era representante de um tipo de conservadorismo. É uma vitoria
que está além disso, muito vinculada ao movimento de nacionalismo e de
valores tradicionais, um discurso anti-migração”, opina o professor.
Como a decisão do Reino Unido influencia outros países a permancerem (ou não) no bloco?
Os grupos políticos nacionalistas de outros países da Europa devem
ganhar mais espaço para o seu discurso após a decisão do Reino Unido.
“Eles vão começar a bradar em vários países europeus: os britânicos
fizeram [saíram da UE] e, se eles saíram, tem algo errado. Isso vai
pipocar na Europa”, diz Lima. Ele explica que o discurso de ódio
nacionalista está muito calcado na ideia de que há “uma relativa pureza
de valores e que o cidadão está ameçado por um elemento que é externo”.
Esse discurso “colou” especialmente em eleitores britânicos de zonas
menos populosas pela percepção de que havia uma “tomada de empregos”.
Não é possível avaliar, entretanto, se as populações de outros países
vão “comprar” esses discursos. Vai depender se autoridades que defendem a
União Europeia vão conseguir combater esse discurso”.
O que é Brexit?
O termo Brexit é a união das palavras Britain (Grã-Bretanha) e Exit
(saída, em inglês). O que estava em discussão no Reino Unido era a
permanência ou não como membro da União Europeia (UE). As nações do
Reino Unido são a Inglaterra, a Irlanda do Norte, a Escócia e o País de
Gales.
Com 52% dos votos a favor, o Reino Unido deixa a União Europeia após
43 anos de participação, segundo resultado do referendo realizado nesta
quinta-feira (23). O primeiro-ministro David Cameron afirmou que a saída
do país do bloco pode trazer graves consequências econômicas para o
Reino Unido. Ele anunciou que renunciará até outubro.O Reino Unido é o
primeiro país a sair da União Europeia.